Inicialmente, é importante consignar que a discussão acerca da natureza jurídica dos tratados internacionais incorporados ao ordenamento jurídico brasileiro diz respeito apenas ao seu aspecto formal, visto que no aspecto material, é unânime o entendimento de que todos os tratados que versam sobre direitos humanos são constitucionais.
Norma materialmente constitucional é toda norma que trate de matéria própria de constituição, sendo que os direitos e garantias das pessoas são tipicamente constitucionais.
Agora, sobre o aspecto formal, atualmente, há quatro posições doutrinárias acerca da natureza jurídica dos tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos.
Uma primeira corrente defende sua "supra constitucionalidade", asseverando que os tratados de direitos humanos estão acima da própria constituição do Estado. Assim, em eventual conflito, deve sempre prevalecer as normas convencionais em detrimento das normas constitucionais. Essa posição é vista com extrema cautela e muitos relutam em aceita-la pois, em tese, seria afronta à soberania estatal dos países.
Para a segunda posição, os TIDH teriam natureza jurídica constitucional, ou seja, seu âmbito de validade seria no mesmo grau que a própria constituição do Estado. É a corrente majoritária para os doutrinadores e estudiosos de direitos humanos. No Brasil, a corrente retira seu fundamento do art. 5º, §2º da CF, que estabelece: "§ 2º Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte". Para os defensores dessa corrente, houve um retrocesso com a inclusão do parágrafo terceiro ao art. 5 da CF, pela EC 45/2004, segundo o qual apenas os TIDH aprovados com quórum especial seria equiparado a Emenda Constitucional.
A terceira posição aduz que os TIDH's teriam natureza jurídica "supralegal", sendo infraconstitucional, porém superior às leis e demais atos normativos. Para essa corrente, os TIDH's teriam que observar os mandamentos constitucionais e poderiam ser afastados em caso de conflito com a Constituição Federal. Por outro lado, as leis e atos normativos deveriam passar pelo duplo controle, um constitucional e outro convencional. Seriam válidos se fossem compatíveis tanto com a Constituição (constitucionais), como com os TIDH's (convencionais).
Por fim, a quarta posição defende que os TIDH's teriam natureza jurídica ordinária, legal, teriam a mesma validade e natureza das leis e atos normativos infraconstitucionais. Estudiosos alertam que tal corrente acaba por menosprezar os direitos humanos, pois qualquer outra lei ou ato normativo poderia revogar ou atenuar a proteção dos direitos fundamentais, em total descompasso com a progressiva e expansiva proteção de tais direitos.
No Brasil, antes da EC 45/2004, o STF entendia que os TIDH’s tinham natureza infraconstitucional. Esse entendimento foi baseado no art. 102, III "b", CF, que prevê ser cabível recurso extraordinário ante decisão judicial que declare a inconstitucionalidade de tratado. Logo, se tratados podem ser inconstitucionais, seriam inferiores à Constituição, portanto, equiparados a lei ordinária.
Após a EC 45/2004, o STF passou a entender que os TIDH’s continuavam a ter natureza infraconstitucional, mas seriam supralegais, portanto, superiores a leis e atos normativos.
Segundo a Suprema Corte, o art. 5º, §3º sinalizava que apenas os TIDH’s que fossem aprovados com quórum especial teriam natureza constitucional e aqueles não aprovados pelo procedimento especial teriam natureza infraconstitucional. Segundo o relator, Min. Gilmar Mendes, o dispositivo teria diferenciado os tratados que versassem sobre direitos humanos daqueles que não diziam respeito a direitos humanos, sendo que apenas o primeiro poderia ser aprovado com status especial e equiparo à emenda constitucional. Os demais tratados, ditos comuns, não poriam ser aprovados pelo procedimento especial e não poderiam adquirir status constitucional.
Assim, segundo o Ministro Relator, havendo diferenciação entre tratados de direitos humanos e tratados comuns e considerando que os tratados comuns são considerados pelo STF a nível de lei, os tratados sobre direitos humanos estariam em um nível acima da lei, portanto, supralegais.
Com o devido respeito, apesar de, possivelmente, não ter sido esta a intenção dos congressistas, a inclusão do parágrafo 3º ao art. 5º da CF causou uma duplicidade de tratamento aos tratados de direitos humanos, havendo dupla natureza jurídica, diferenciação inconcebível para os direitos humanos.
Com efeito, os direitos humanos possuem como característica a indivisibilidade, não podem ser fracionados. Logo, o fracionamento da natureza jurídica dos tratados que tratam da matéria certamente afronta à indivisibilidade do próprio direito. É como se dissesse que o aspecto formal é superior ao aspecto material da própria norma, causando diferenciação não fundamentada.